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COLUNAS 07/11/2020

TRIUNVIRATO: Histórias de família!

Profa. Dra. Maria José Carvalho de Souza Domingues
Programa de Pós-Graduação em Administração e Ciências Contábeis - PPGAD e PPGCC  
Pesquisadora e líder do Grupo de Pesquisas em Gestão de Organizações Complexas e Ensino Superior
 

Recentemente as pessoas têm manifestado um interesse crescente pela história de suas famílias. Querem conhecer suas origens, sua genealogia, de onde procedem seus antepassados e como era suas vidas. Muitos são motivados apenas pela curiosidade, outros buscam também a possibilidade de adquirir uma outra cidadania que possibilite a mudança e permanência no país de origem de seus antepassados. Muitas vezes querem viver em um lugar que proporcione uma vida melhor. 

 

Quando eu era menina, escutava com atenção as histórias que meu pai contava sobre a família. Falava de seu avô, Horácio de Carvalho o amigo de Cruz e Sousa, Virgílio Várzea e demais companheiros de poesia e do movimento conhecido como “guerrilha literária” ocorrido na Desterro (atual Florianópolis) no final do século XIX. Era tudo muito distante. Falava também de seu tio Eduardo Horn, grande empresário de Florianópolis do início do século XX. Adorava essas conversas. E com a idade, meu pai as repetia sempre que possível. 

 

Outra oportunidade que tinha para saber sobre a família, agora pelo lado materno, era frequentar quase que diariamente a casa de meus avós. Como morávamos na mesma rua, era muito fácil e gostoso, depois de fazer os deveres, ir caminhando até a casa deles. Assistia aos programas de televisão na enorme Telefunken, um aparelho em cores, tão grande que parecia um armário. Quase sempre os convencia a sintonizarem meus programas favoritos. Também ouvíamos rádio em um aparelho que ficava em um lugar de destaque na enorme cozinha. O café da tarde era sempre acompanhado de boas conversas e histórias da família. Relatos de namoros, encontros, desencontros e sempre aquelas histórias com um lado mais picante que toda família tem. Quem teve a oportunidade de conviver com os avós e tios e tias mais velhos, sabe bem a felicidade que são esses momentos. 

 

O tempo passou e como nada daquilo foi anotado ou registrado, muito se perdeu. Fiquei praticamente refém da memória. Já adulta e fazendo meu doutorado, aproveitei a oportunidade de estar mais tempo em Florianópolis e comecei a realizar uma pesquisa sobre meu bisavô paterno Horácio de Carvalho. Junto com meu pai, mais preparada e impulsionada pelos conhecimentos em pesquisa científica, procurei me cercar de documentos, fotografias, entrevistas e tudo mais que houvesse de concreto sobre o assunto. 

 

Por sorte, pude contar com a ajuda especial de suas duas filhas ainda vivas: Tia Maria e Tia Carmen. Ambas se envolveram no projeto de resgate da memória de seu pai. Foram momentos incríveis com muita visita, deliciosos cafés e tudo temperado com muitos nomes, sobrenomes, fotos, datas, casos e acasos. Tomei gosto pela coisa, mas tudo era tudo muito difícil. Anotava tudo em papel e depois digitava. Já os escritos de Horácio eram muito difíceis de encontrar. O tempo ia passando e nada de achá-los. 

 

Entretanto, tudo mudou rapidamente quando as hemerotecas digitais apareceram. Primeiro a nacional e depois a catarinense. Os textos, então passaram a aparecer e ainda hoje se revelam tão logo os jornais e revistas vão sendo digitalizados. Assim, consegui elaborar e terminar mais facilmente o livro sobre o Horácio graças à digitalização dos periódicos. Lamento que meu pai não viveu o suficiente para ler a obra, mas tive a oportunidade de entregar o livro para a tia Carmen, agora centenária que pode pela primeira vez ler a obra sobre seu pai. 

 

Mas nada disso se compara com as possibilidades que hoje os softwares de genealogia podem oferecer. Quem já procurou fazer a sua árvore genealógica sabe da dificuldade que é encontrar os seus antepassados depois dos seus trisavós. Inicia-se pelos seus pais, avós até chegar nos bisavós. Depois disso é muito difícil saber nomes, datas e lugares. Esses softwares, no entanto, ajudam a fazer essa magia. Por um sistema de busca via robots esses aplicativos nos ajudam e com um simples clique, pode-se encontrar informações e adicioná-las na sua árvore genealógica. Pelo menos até onde os registros estejam digitalizados. Por exemplo, pode-se conseguir de ascendentes que viveram no século XV ou até além. Depende do quanto há de digitalização dos registros contidos nos acervos religiosos e governamentais onde você pesquisa.

 

Alguns passos básicos ajudam a elaborar os registros genealógicos. Essas dicas são frutos da minha experiência, mas é fundamental para quem quer se aventurar na busca. 

 

1) Encontre sua certidão de nascimento: com este registro você obtém as informações sobre seus pais e seus avós. Converse com seus pais ou parentes sobre seus antepassados. 

2) Veja se eles têm outros documentos contendo os registros de nascimento, casamentos, óbitos, batizados, cartas, fotografias ou outras anotações. Isso facilita bastante. 

3) Procure e registre-se em um site específico para obter informações e começar a montar sua árvore genealógica. Existe o  My Heritage, o Family Search, o Geneanet e outros. Alguns podem ser gratuitos e outros pagos. Procure o que mais lhe agradar e sempre vá registrando e anexando as fontes de informação. 

4) Tenha muita paciência e persistência, isso é fundamental. 

5) Associe-se a algum grupo de genealogia que existem em redes sociais (confiáveis), para obter mais informações, tirar dúvidas e compartilhar resultados. Pesquise com cuidado e não vá pensando em encontrar somente nos sobrenomes que você utiliza hoje.

 

 

Quando você chegar a um antepassado (que possa te proporcionar uma outra cidadania, por exemplo) este poderá ter um sobrenome bem diferente do que lhe foi dado. Incrível o que pode ser alterado em algumas gerações.  Uma das coisas mais surpreendentes que acontece quando você pesquisa seus antepassados é encontrar situações muito peculiares das quais você não fazia ideia. No caso dos descendentes de açorianos procedentes da Ilha terceira, por exemplo, é muito comum ascendentes que foram judeus sefarditas. Foram para os açores forçados pela Inquisição, processo instituído pela Igreja Católica Romana e adotado pelos países da Península Ibérica  por volta do XV que durou até o início do século XIX. 

 

Outra curiosidade é que durante muito tempo se achava que todos os que tinham sobrenome germânico tinham vindo exatamente do local hoje denominado Alemanha. Sabe-se, entretanto que a Alemanha não era um bloco homogêneo e a região em outras épocas abrangia várias nações. Assim, quem tem um sobrenome de origem germânica, ao pesquisar suas origens pode descobrir ser descendente de um luxemburguês, suíço, austríaco ou até mesmo belga. 

 

Quem diria que o fluxo de pedidos seria tão grande que iria gerar a criação um consulado de Luxemburgo no Município de Palhoça. Pois é, aconteceu. Mas para mim, mais importante do que encontrar sobrenomes famosos e antepassados nobres, é conhecer as histórias dessas pessoas. Suas dificuldades, lutas, angústias e sucessos. 

 

Somos descendentes de pais, avós, bisavós, trisavós, enfim, pessoas que deixaram herança de coragem e persistência numa terra que acolheu exilados, perseguidos, lutadores, aventureiros e sonhadores. Conhecer a história de sua família é uma oportunidade de reflexão de sua própria existência. Para mim, tem sido uma oportunidade de conhecer pessoas, estreitar laços, me conectar à minha essência. E tenho descoberto que a inquietação e a busca dos ideais de liberdade são minha principal herança. 

 

Foto: acervo pessoal da Familia Carvalho de Souza


Fontes:

https://www.familysearch.org/pt/

https://www.myheritage.com.br

 

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